sexta-feira, novembro 22

Uma das más recordações que tenho da minha infância, é a de assistir a uma matança do porco.
Devia ter uns 5 anos, lembra-me que ainda não andava na escola.

O ritual era feito em frente á capela da aldeia, por baixo dum telheiro onde o porco foi pendurado.
Eles sentem o perigo, por isso o bicho começou a guinchar (percebi a expressão guinchar que nem um porco), já isso era aflitivo. Depois espetaram-lhe a faca no pescoço e ao ver o sangue a jorrar em golfadas, foi demais para mim, corri para longe, e miúdo, fui chorar em cima da Ponte Nova.

Não condeno o acto, mas nunca convivi bem com o ritual. Menino da cidade.
Nas minhas férias de verão na aldeia de meu pai, sempre tive contacto directo com os animais, e com a sua morte para servir de alimento.
Ajudava no campo como os meus primos, que nunca fui de ficar quieto a ver os outros a trabalhar, e convivi com galinhas, porcos, cabras (essas ainda continuo a conviver), coelhos, bem como os selvagens, sapos (que apanhava á noite, ás vezes apanho com cada um…), lobos, javalis, cobras, águias, enguias, peixes de rio, e toda a fauna das Serras do Açor e Lousã.
Hoje muitos destes animais já são difíceis de encontrar.

Um dos episódios que me marcou foi numa altura de festa na aldeia, penso que no verão, pela quantidade de família presente. Estávamos a jogar cartas numas das escadas que davam acesso á casa de uma tia-avó, quando uma galinha sem cabeça passa por cima do jogo, e se estatela no meio da rua, depois de saltar os degraus e correr pelo longo corredor, que atravessava a casa, vinda de um pátio do lado oposto.

Outra das cenas deliciosas que assisti várias vezes foi a de ver os cabritos aos saltos, aquando da chegada dos rebanhos ao curral, pois eles não iam pastar á serra junto com os adultos. Saltavam com as quatro patas ao mesmo tempo, parecendo ter molas, numa histeria colectiva por cima de muros e telhados.
Eu ia com o meu tio Armando guardar as cabras para a serra da Lousã.
Cabras são bichos danados que comem tudo o que apanham (eu avisei), e por isso o leite de cabra, que bebi aos litros, e adoro é muito saudável e rico em proteínas.
Os queijos que as minhas tias faziam, uns frescos, outros semi duros, eram deliciosos. Os da minha Tia Jesus, que a minha mãe e meu irmão diziam ser porca (uma mulher que sempre vi a cada limpa, ao contrario de minha mãe, e que trabalhava no campo), mas que os comiam, inclusive os que a minha tia dava para me entregarem, eram os de pasta mole. Os da minha tia Irene eram os frescos, enormes, e que não davam a comer aos meninos de Lisboa, um dia eu, o meu irmão e duas minhas primas atacamos um inteiro e foi um ver-se-te-avias. A minha tia ficou satisfeita e acabou-se o queijinho flamengo para os sobrinhos.


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