sexta-feira, agosto 30

Noite.
Corpos, suor, calor, dança, bebida, conversa, olhares, risos, barulho, álcool.

No meio disto tudo comédia e drama. Muito drama, ódios e amores, por vezes sexo.
Uns fracos e falhados, outros fortes e sucedidos.
E o amor é lindo depois das 4 da manhã e 5 vodkas.
Falar, falar, falar e existir corpos.
Pessoas a falar de pessoas, pessoas a falar de coisas, pessoas a falar só por falar, só para terem algo para dizer.
Pessoas que se cansam com conversas banais de gente banal, a maioria com medo, medo de não ter interessem, medo de estarem sós no meio de tanta gente, de não serem populares e desejados.

Olham uns para os outros sem dizerem palavra, o gajo até é porreiro, mas procura-se os bíceps. Pode ser um crápula da pior espécie, mas é sempre escolhido em detrimento do simpático, mas “feio”.
Os homens estão tramados.
Homem e mulher misturam-se, por vezes no mesmo corpo. Tudo misturado.
Acompanhados mas muito sozinhos. Conhece-se muita gente, mas não se conhece ninguém. Ludibriam-se, mas no escuro são eles próprios. Multiplicam-se em vários “eus” para esconder a verdadeira natureza.
Gente vaga e fugidia, fragmentada.
Esperam. Por vezes demasiado. Esperam pela sétima maravilha do mundo, que pensam estar-lhes destinada, porque andaram a malhar no ginásio e isso tem de dar resultados.
Sempre nos mesmos locais, uns sentam e esperam, outros não param quietos.

A noite avança e a ansiedade cresce, as garrafas e copos vazios multiplicam-se e são levados pelo empregado, farto de aturar tanta gente estúpida e malcriada.
A espera continua, á espera de algo que os surpreenda. O outro que até nem era nada de se deitar fora, farta-se e encontra outro, ou vai-se embora.
Os corajosos ou os convencidos da sua beleza física metem conversa. Tentam conquistar, alguns são rejeitados, há sempre alguém mais convencido do que eles. Por vezes as regras invertem-se, mas faz parte do jogo.
Passa-se o tempo a rodar o pescoço, em busca de alguém que encha os parâmetros, de copo na mão, cigarro na outra. É um corre-corre na discoteca.

A subida para o quarto escuro aumenta de intensidade é medida que as horas avançam. Taras, risos, medos, excitação e muito álcool e drogas.
A procura da perfeição não abranda, os rituais repetem-se, semana atrás de semana. Sempre é permitido sonhar.

A música pára (aplausos ao DJ), os clientes são convidados a sair.

Amanheceu.

quarta-feira, agosto 28

Hoje em dia tudo se resume a ter.

Ter uma casa enorme num local in, um carro potente xpto, um telemóvel topo de gama com G’s a dar com um pau, umas férias em local de luxo com celebridades a rodos, filhos em colégios caros e de elite.
E começa-se já de pequeninos. Fazem de ter a sua procura de felicidade, são felizes em ter, e pior de tudo em que os outros não tenham, para se sentirem superiores.

Se há coisa que me choca e irrita é gente anti-democrata, aproveitar-se da dita democracia para fazer passar as suas ideias ditatoriais, e como muitos democratas defendem o direito e a liberdade de expressão, temos o caldinho feito. E defendem a liberdade de propagação de ódios ás minorias.
Se defendem o direito a ser neonazi, então não podem castrar os direitos dos pedófilos, dos incendiários, dos violadores, dos assassinos. Que eu saiba todos estes atentam contra a integridade física e psíquica dos outros.

E as mulheres no meio disto tudo, o seu consentimento e apoio ás atitudes dos seus homens, dos seus filhos são o que mais me choca. Elas que durante séculos foram, e ainda são, vítimas do preconceito machista das religiões e do poder patriarcal, apoiam e ensinam o ódio aos próprios filhos.
Embora elas nos queiram convencer do contrário, a maioria das mulheres não quer homens inteligentes, nem meigos e atenciosos, a esses elas apelidam de fracos.
Ou seja, querem homens com os “defeitos” de que se queixam toda a hora. Vamos lá entendê-las…
Ainda bem que gosto de homens.

Mas como sou um homem de fé, e vejo mulheres que não pensam assim, ainda vou tendo esperança e fé.
Já tou a imaginar-me numa fogueira LOL
Ainda me soam nos ouvidos todos os insultos e gritos que na vida me brindaram, por ser “diferente”, como se a diferença fosse um defeito, e não uma virtude. A grandeza do ser humano está na diversidade, não somos formigas, nem abelhas, como muitos querem que sejamos, somos gente, humana.
EU bem os ouvi aos insultos e gritos na famosa “vigília da senhora dona Isilda Pegado.

Toda a gente tem uma “ordem natural das coisas”.

terça-feira, agosto 27

Existem 4 tipos de pessoas: os calões, os pimba, os conformados e os inconformados.

Os calões são aqueles que fazem tudo o que lhes mandam ou fazem tudo para não fazer nada. Acham que a vida é uma sucessão de eventos, passam a maior parte do tempo a discutir jogos de futebol (eles) e a vida dos outros (elas).
Gritam muito, são espalhafatosos, bajulam os que acham superiores a eles ou os de que se querem aproveitar, e tratam abaixo de cão os que julgam inferiores. Afundam-se muito mas acabam sempre por flutuar.

Os pimba são primos dos calões e quando digo primos não falo em graus de parentesco. São tão fúteis e arrogantes como os calões, mas por vezes pensam, o que não quer dizer que seja uma boa coisa, pois pensam, dizem e fazem montes de disparates.
Estes ao contrário dos calões adoram títulos e rastejam ao ver um todo poderoso, o que para eles é qualquer um que tenha dinheiro ou um canudo, ou pior um cargo influente.

Os conformados são ex-inconformados que desistiram de lutar, limitam-se a queixar-se, a reclamar, a viver “ a vida loca” para esquecer as misérias, alguns até já desistiriam de votar.
Metem-se em adições para atenuar a revolta e a raiva.

Os inconformados também se revoltam, mas agem. Contribuem para a melhoria. São poucos, mas fazem o que muitos não são capazes ou não querem fazer, em beneficio de todos.
Sofrem mas não desistem, acreditam na igualdade, na liberdade, na democracia, e elogiam quem pensam merecer.

E depois o mundo está cheio de palermas, e a nível humano regredimos em poucos anos, nas conquistas que levaram séculos a conquistar.
Sempre pensei que a era da comunicação e da informática global, da Internet, abri-se a mentalidade tacanha da maioria das pessoas, que o acesso fácil á informação traria mais conhecimento.
Puro engano, continuam estupidos e ignorantes, como sempre foram. Ou pior.


segunda-feira, agosto 26

Era dia 25 de um Agosto cheio de calor.
Nessa altura eu vivia em Pêro Pinheiro, e trabalhando em Lisboa, apanhava todos os dias o comboio da linha de Sintra, na estação da Portela de Sintra para o Rossio, onde apanhava o metro para a Alameda onde trabalhava.
Era quinta-feira e mais um dia de trabalho, num mês típico de férias.
Ouvia-se no comboio as pessoas a falar que havia um incêndio no Chiado, mas não havia alarme, apenas comentários avulsos de gente que já se conhecia de viagens diárias.
O meu ex saiu em Campolide, onde trabalhava, e eu segui para o Rossio pelo túnel enorme que ligava as duas estações.

Quando chegamos á estação do Rossio, o primeiro sinal de que algo não estava lá muito bem foi a estação vazia.
Nessa altura a estação do Rossio era o terminal de todos os comboios da Linha de Sintra e da linha do Oeste, por isso estava sempre cheia de utentes e comboios. Nesse dia o comboio entrou numa estação vazia, apenas com alguns polícias num cais com plataforma dupla (dos dois lados), que mais tarde percebi ser estratégica para evacuar os passageiros da estação o mais rápido possível.
Nessa altura a estação do Rossio tinha sido transformada num grande centro comercial, e nesse dia fomos obrigados a sair pela saída do topo, onde está a praça de táxis, pois o centro estava fechado e vedado.
A primeira visão que tive foi logo ao sair da estação. O fumo negro e espesso que tapava o sol, e as bolas de fogo que de repente se viam, acompanhadas com o som das explosões das bilhas de gás, que subiam aos céus.
Tinha 20 anos na altura, mas já amava a minha Lisboa onde nasci, e o meu coração estremeceu e ficou apertado, e fiquei assustado.

Fomos encaminhados para o Rossio, que se tinha transformado de um grande terminal de autocarros, num enorme parque de carros de bombeiros.
Do Rossio tinha-se uma noção da gravidade da situação, eram umas 8.30 e o incêndio estava longe de ser dominado, e caminhava Rua do Carmo e Rua Garrett acima, e lavrava em 3 direcções, Sul, Este e Oeste tendo já chegado á Rua do Crucifixo. O elevador de Santa Justa, feito de ferro, impediu-o de descer a rua para sul.
Percebi que parte de minha infância tinha morrido nesse dia, que aquele Chiado não ia ser mais o mesmo dos meus tempos de miúdo e adolescente. Nesse dia quase que não se trabalhou em Lisboa, não se conseguia ir á Baixa, onde estavam a maior parte dos organismos estatais onde eu ia tratar de documentação para a empresa onde trabalhava.
Até ao meio da tarde temia-se que o incêndio alastra-se á Baixa e ao Bairro Alto, por isso o centro tinha sido encerrado e a luz cortada.
Foi um dia de angústia.

Mas a sexta-feira ainda foi de mais angústia, bem como os dias seguintes, quando nos apercebemos da quantidade de área ardida, e do que se perdeu no grande incêndio.
Chorei, chorei de tristeza por ver a minha Lisboa, o meu Chiado queimado, destruído, estava de luto, negro, como de luto ficaram os alfacinhas que amavam Lisboa como eu.

Não se sabe ainda hoje o que originou, ou quem, o incêndio.
Sabe-se que foi descoberto ás 4.40 pelo electricista do Elevador de Santa Justa, que viu o fumo sair dum buraco de um vidro de uma montra junto ao chão, o que quer dizer que o fogo começou nas caves, que o policia de serviço na zona deu o alarme aos bombeiros perto das 5 da manhã, que os bombeiros chegaram ao local 20 minutos depois, já o Grandela era um todo de chamas, sabe-se que não conseguiram entrar na Rua do Carmo por causa das esplanadas e contentores de entulho que atravancavam a rua.
E sabe-se no que deu…

Mais de 1 600 bombeiros combateram o fogo, um faleceu, e evitaram danos maiores, no que poderia ter sido uma tragédia incalculável na cidade. As temperaturas atingiram tal ordem que até as grandes vigas que tinham sido colocadas há pouco tempo para reforçar as fachadas do Grandela e dos Armazéns do Chiado dobraram como borracha.
Se não houvesse aquela tralha na Rua do Carmo teria só ardido os armazéns do Grandela, assim foram 18 os edifícios ardidos, outros tanto danificados pelas altas temperaturas e pela água e 3 mortos.
Tudo isto de pode agradecer ao então presidente da câmara municipal de Lisboa, Nuno Krus Abecasis, que foi um dos mais destruidores de património que a cidade conheceu.
Até o vice primeiro-ministro da altura, Eurico de Melo, reconhecia na comunicação social que se a Rua do Carmo não tivesse aquela tralha o incêndio teria sido rapidamente dominado.

Passados 25 anos nunca ninguém foi responsabilizado pelo sucedido, não foi Nuno Abecasis pelo crime lesa património (alem dos edifícios, do rombo na economia da cidade, acrescenta-se o valioso espólio da Valentim de Carvalho, perdida para sempre uma boa parte da história da musica portuguesa), nem foram os donos do Pagapouco, na altura donos do Grandela e dos armazéns do Chiado, e também na altura presos por fuga ao fisco.

O Chiado renasceu das cinzas com a Fénix, sob a pena de Siza Vieira, um dos nossos maiores arquitectos. As pessoas voltaram á zona nobre e amada. A alma é outra, mas sobreviveu á catástrofe.
Mas alguma coisa de aprendeu?


domingo, agosto 25

Apontem-me alguém que não tenha uma contradição.

Encontrarmo-nos é muito complicado. Quando estou só tento sempre encontrar-me e analisar-me, não por esquizofrenia, mas para ver o que podia ter feito de melhor, e apreender com os erros e falhas.
O mundo anda doido, e se nos deixarmos levar, endoidamos com ele, pois acho que não vou ver a solução na minha curta vida.
Para mim o mais inteligente seria desistir, perder-me na mediocridade, passar a “lamber botas” dos medíocres.
Mas fui bem “treinado” pelos grande que passaram na minha vida, e pelos que hoje fazem ainda parte dela, (e desconfio que muitos me vão aturar muito tempo). Não consigo trair os valores que me ensinaram, nem trair a minha honra e o meu carácter humano.

Dizem que sou inteligente, culto, educado, pró-activo, diligente. Recebo elogios de colegas e clientes, mas não tenho “perfil”. Como me devo sentir?
Revoltado, angustiado, triste.
E depois é suposto encarar isto com assertividade, “ter força” (eu davas a força com ajuda dos glúteos). Eu devia ter força sim, para andar á chapada a esta gente toda.

Li um comentário de um “escritor” que compara o “movimento” anti-tabaco com o fundamentalismo islâmico e os movimentos anti-aborto. Confesso que o único aborto que vejo nele é o do seu cérebro. Comparar os “direitos” dos fumadores a um atentado como o 11 de Setembro, ou a defesa do direito á vida e á saúde, é algo mais do que idiota.
Sempre defendi a liberdade, sei o que é viver sem ela. E quem quiser fumar tem o direito de o fazer, mas esse direito não pode ser superior ao direito de os outros a não fumar. Que eu saiba os não fumadores nunca prejudicaram a saúde dos fumadores, já o contrário e mais do que sabido e provado.
Portanto quando falamos dos direitos dos fumadores falamos de quê?
Do direito a eles fumarem para cima de mim? O direito a prejudicar a saúde de outros, incluindo criança e até mesmo fetos? O direito a compuscar as ruas com as suas beatas? O direito a usar o dinheiro dos meus impostos (sim dos “fundamentalistas e fascistas” dos anti-tabaco), em tratamentos de saúde provocados pelo seu “direito” a fumar?


Já agora venham-me vender a ideia que o tabaco é bom para a saúde, e que é sexy e estiloso ter a boca a saber a cinzeiro, e os dentes amarelos e podres…

segunda-feira, agosto 12

Gosto de sexo.
Como toda a gente tenho as minhas fantasias, umas concretizadas, outra não, e algumas que não quero que passem de fantasias.
Mas sempre encarei o sexo como uma satisfação saudável, nem podia ser de outra forma.

Não sou pudico, nem moralista, embora, como todos, tenho os meus tabus e os meus limites.
Encarar o sexo como uma actividade normal e saudável é sinal de maturidade e inteligência. Uma das vantagens de não se ser novo é que já se viveu e viu muito para ter aprendido e aperfeiçoado muitas coisas.
O que já vi e ouvi, e o que já fiz dava para corar um século de freiras num convento.

Embora tenha nascido com “um comportamento sexual desviante” (como se dizia na altura em que descobri a minha sexualidade, estávamos no ano de 1982), sempre a vivi o melhor que soube e pude.
O meu “descaramento” ao falar sobre sexo tem a ver com a naturalidade como o encaro, e a separação que faço entre sexo, amor e afectos.
E dou mais valor ao amor e aos afectos.
Mas eles não estão dissociados do sexo. E convenhamos que só o sexo não satisfaz, pelo menos a médio e a longo prazo.

A sexualidade de cada um deve ser respeitada. Tudo na vida se resume a confiança, respeito e amor, por esta ordem, até no sexo.
Por isso os meus amigos falam comigo sobre sexo com naturalidade, pois sabem que eu não sou moralista, e que tenho poucos tabus. Também tem a ver com a minha idade, mas muito com aquilo que já vivi, sexo, sim muito, com prazer e com saúde.
Por isso foi natural que aceitasse o desafio de um amigo, que na altura era voluntário da ILGA, para fazer parte da “Brigada do Preservativo”.
Comecei com os transsexuais e trangeneros, na altura com algum receio, pois era uma parte da população LGBT com quem não tinha contactos, e por isso pouco familiar.
Foi uma experiência que me fez alargar os meus horizontes, quebrou preconceitos, e fez-me evoluir como ser humano. Tornou-me melhor.

Depois passei para o Bairro Alto, misto de população LGBT e hetero, onde estranhamente é mais difícil trabalhar. As vezes que nos dizem que não precisam de meios de protecção sexual é chocante.
Uma coisa é não usar, outra é não precisar. Não usar é uma escolha, não precisar é um erro. São opções… As razões que evocam é que me chocam, pela ignorância, principalmente nas camadas mais jovens da população, as que tem mais acesso á informação.

Com o boom do aparecimento dos bares bears (ursos) na zona entre o Princepe Real e São Bento, e as portas abertas, por isso o pessoal na rua, foi natural que a ILGA apostasse mais nessa zona do que tinha feito até ai, em que o facto de os bares serem á porta fechada, e havendo a entrega directa de material aos bares, não houvesse necessidade de uma equipa direccionada para a zona.
Calhou-me a sorte de fazer parte dessa equipa, porque sendo também identificado como um urso, foi mais fácil e natural o contacto com a zona e os seus frequentadores.
Com o Conde Redondo, esta é a zona em que somos mais bem recebidos, salvo tristes excepções.

E este trabalho não se esgota nas brigadas mensais. Existe outro trabalho de sapa, que envolve uma equipa empenhada, e contribuo noutras actividades na ILGA, umas mais visíveis do que outras.
Tirando as já citadas rara excepções, repito somos muito bem tratados, e ao longo destes anos de trabalho com a comunidade LGBT e os seus locais de diversão, fui ganhando o respeito e o carinho, e algumas amizades, que me fazem feliz, e com mais vontade de continuar a fazer o trabalho com empenho.
Nunca usei nada nem ninguém para conseguir benesses ou vantagens, nem para ser tratado de maneira especial. Quem me conhece sabe que não sou dado a essas atitudes. Por isso a estima que recebo é-me duplamente recompensadora. A todos os que me estimam e me tratam com o carinho que me dão, o meu muito obrigado. São vocês que me dão o animo, e a força, para, mesmo quando o tempo não ajuda, ou a carga é demasiado, em que o esforço e o cansaço fazem mossas, em que por vezes obriga a noites em dormir, que valha a pena.
E obrigado companheiros da ILGA por me permitirem fazer isto, pelo vosso apoio, pelo vosso carinho, pela confiança depositada, e pela amigos que me deram.


Vocês fazem de mim um melhor homem.