Era uma vez uma bicha, que trabalhava na sala laranja.
Na sala laranja, a bicha era uma técnica, uma apoiante técnica,
e atendia chamadas de clientes, e outras bichas, iradas porque não tinham Sport
TV, ou não conseguiam ver as mulas ou os broncos da Casa dos Segredos.
A bicha da sala laranja anda pelos corredores com passinhos
curtos, rápidos e como se tivesse um cartão de credito da Zara entre os
joelhinhos.
A bicha da sala laranja olha para as outras bichas de
soslaio, a fazer-se de difícil, arma-se em diva impenetrável, embora seja
exactamente o oposto que quer.
A bicha da sala laranja é muito profissional, nunca sorri
para os outros, não se junta ás outras bichas, que por sua vez andam como os
flamingos, aos pares. As outras bichas da sala laranja, e das outras salas de
outras cores, juntam-se em bandos no refeitório, riem-se desbragadamente com
agudos que fazem roer de inveja a Celine Dion, gesticulam imenso, e tem sempre
as amigas gajas que as acompanham no galinheiro.
A bicha da sala laranja não traz marmita, como a maioria das
outras, mas quer levar nela. Ao contrario dos outros lados as bichas da sala
laranja comem fast-food das maquinas do refeitório, sandes manhosas, chocolates
cheios de açúcar, bebidas gasosas (como elas), iogurtes líquidos com cores que
combinam com as suas vestes, berrantes, á Goucha, batatas fritas cheias de óleo,
ou mandam vir pizzas ou sushi (que as mais finas comem em gabinetes).
A bicha da sala laranja só se derrete para o garanhão da
sala, ficando dengosa e lamechas quando ele lhe dirige a palavra, sendo
grosseira para os outros, nessa altura ela saltita como o Bambi, e esvoaça a
sua cabeça como as piquenas dos anúncios dos shampoos. E nessas alturas ela não
esvoaça, levita.
A bicha da sala laranja não gosta de bichas modernas, mas não
gosta que a achem antiga, não faz activismo gay, nem vai ao Príncipe Real ou ao
Bairro Alto, a não ser ao Finalmente (ao Lugar ás Novas) ou ao Trumps (em dias
de festa), nem participa na Marcha do orgulho Gay e no Arraial Pride (isso é
para as pirosas). Aliás diz mal das bichas activistas, dos gays que jogam
rugby, enfim de todos os gays em geral, incluindo as suas amigas bichas.
A bicha da sala laranja bebe e come sempre de dedinho
espetado, porque lhe disseram que era chique, a Kardashian faz, como se tivesse
tido uma trombose ou um AVC, e usa cremes nas trombas que tem mais camadas que
um bolo de noiva, e por vezes até usa rímel e um batom que diz sempre que é para
o cieiro.
A bicha da sala laranja quando fala tem sempre a mão como se
tivesse o pulso quebrado, e segurasse um saquinho de compras de pano de alguma
loja chique, fala muito e alto, mas é a primeira a queixar-se do barulho, tal
como do frio, do calor, do cheiro. Usa sempre vestes esvoaçantes e leves para
lhe acentuar a figura esbelta que ela pensa que possui.
A bicha da sala laranja sonha um dia mudar de cor… nem que
seja ficar roxa de levar nas trombas do preto musculado que trafica haxixe na
rua.